«Estamos duas vezes armados se lutarmos com fé» Platão
Platão,
segundo relatos e escritos da altura nasceu entre 427/428 a. C., em Atenas. Foi
um filosofo e matemático do período clássico da Grécia Antiga. Foi considerado
a figura central na história do grego antigo e da filosofia ocidental,
juntamente com o seu tutor Sócrates e seu pupilo Aristóteles. Platão ajudou a
construir os alicerces da filosofia natural, da ciência e da filosofia
ocidental e também tem sido frequentemente citado como um dos fundadores da
religião ocidental, da ciência e da espiritualidade. (fonte Wikipédia).
Desde 1993,
trabalho com indivíduos adultos com adicção (doença com fatores
neuro-bio-psico-social), 1) a substâncias psicoativas geradoras de dependência,
licitas (bebidas alcoólicas) ou ilícitas, e também trabalho com indivíduos com
2) adicção a comportamentos adictivos (exemplo, jogo patológico, ao sexo) e indivíduos
que são adictos a 3) substancias psicoativas e ao mesmo tempo comportamentos
aditivos e/ou perturbação mental (comorbilidade – diagnostico duplo ou triplo). São várias centenas, talvez um
milhar de indivíduos e nenhum deles, nem um, alguma vez mencionou o desejo de
se tornar um adicto. De salientar as implicações, severidade, as consequências
e sintomas da adicção – cada caso é único. Ficar doente é o resultado de um
processo gradual, dinâmico e complexo. Também é verdade que ninguém fica adicto
a substâncias psicoativas ou comportamentos de um dia para o outro. Contudo se
alguém está preocupado com o seu comportamento impulsivo e repetitivo, seja com
o consumo de drogas, incluindo o álcool, ou comportamentos, isso pode querer
dizer que já tem um problema de adicção na sua vida, mas, mas isso não quer
dizer que vá pedir ajuda, naquela altura, naquele momento, podem passar anos a
fio até que a ajuda eficaz, direta ou indireta chegue.
Na sociedade,
um dos fatores mais negativos relacionados com o tratamento da adicção é o estigma.
Felizmente, comparativamente, com há trinta anos atras, hoje o estigma persiste
e continua a fazer vítimas, mas aparenta estar mais “enfraquecido” devido aos
avanços no tratamento, na informação dos meios sociais, no apoio psico social
de várias instituições do estado e/ou privadas, no apoio de proximidade por
parte dos profissionais e na informação disponível na internet. Convém realçar
que apesar de evolução e dos avanços o estigma não desapareceu. Desde os seus
primórdios, há milhares de anos atrás até à atualidade o estigma (as pessoas,
as famílias e a sociedade) permanece ativo como uma doença, com marcas bem visíveis.
Mudam-se os tempos, mas não se muda as vontades. Não são as pessoas de fracos
recursos, os “alvos” prediletos, a adicção é um fenómeno transversal na
sociedade, afeta “ricos”, pobres”, “pretos”, “brancos”, “mestiços” advogados ou
mecânicos, etc.
Como é que
se trata a doença da adicção, num contexto onde o estigma permanece ativo e a
influenciar negativamente, pessoas, famílias, profissionais e instituições
(sociedade)?
Como se
combate o estigma que conduz ao isolamento, à doença (adicção) depressão, à
separação, à vergonha e a negação?
Perante
estas duas questões, iremos abordar o que é o estigma e como afeta pessoas,
familiares, profissionais e instituições ligadas à prevenção, ao tratamento e á
recuperação dos comportamentos adictivos-
O que é o estigma?
Segundo o dicionário da Bertrand da Língua Portuguesa, entre os antigos gregos
designava sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de
extraordinária ou de mau acerca do estatuto moral de quem os apresentava. Tratava-se
de marcas corporais feitas com cortes ou com o fogo que identificavam de
imediato um escravo ou um criminoso. Por exemplo o conceito atual é mais amplo,
considera-se estigmatizante qualquer característica, não necessariamente física
ou visível que não se coaduna com o quadro das expectativas sociais acerca de
determinado individuo. Referencias: Erving Goffman
Quando
abordo o tema da adicção no tratamento e recuperação dos comportamentos, a
maioria dos indivíduos e as suas famílias sente vergonha, culpa, isolamento,
depressão e ressentimento – associado ao estigma. Estas pessoais sentem que são
diferentes daquelas que estão, aparentemente, “perfeitamente integradas num
sistema moral imaculado (sociedade) e que aqueles que carregam o “rotulo na
testa”, “fazendo uma analogia com os antigos gregos, apresentam uma “marca”
negativa. Quando indivíduos aparecem para o tratamento, assim como as suas
famílias que os acompanham, é visível a vergonha, a raiva, a culpa. Após as
primeiras sessões quando abordo o conceito de doença da Adicção (National
Institute on Dug Abuse, American Society of Addicton Medicine, National
Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism) muitos referem uma sensação de alívio.
Antes do tratamento a noção da realidade, era totalmente enviesada. Eram
considerados e rotulados (identidade individual e identidade social) como
toxicodependentes ou comportamentos desviantes ou marginais ou “ovelhas negras”
ou “casos perdidos” e acarretava um rotulo, um diagnostico “desviante” para o
resto da vida. Algumas famílias, afetadas pelo estigma, quando identificam um
problema relacionado com comportamentos adictivos num dos seus membros,
imediatamente “mobilizam-se, primeiro “esconder da vizinhança e do resto da família o membro doente e
segundo procuram os recursos para o tratamento com base nas dinâmicas e
hierarquias familiares, isolando e fechando o segredo a “sete chaves”, mesmo
que o ambiente seja perturbador para as crianças da família- Um antigo ditado
popular afirmava: - “Aquilo que acontece cá em casa, mais ninguém pode
saber…segredo absoluto” e acrescento, mesmo que o ambiente familiar esteja caótico.
No discurso sociológico, o conceito de estigma assume quase sempre o significado que Erving Goffman (1922-82) lhe atribuiu na obra Stigma - Notes on the Management of Spoiled Identity, de 1963. O termo estigma, entre os antigos gregos, designava "sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou de mau acerca do estatuto moral de quem os apresentava”. Todas as sociedades definem categorias acerca dos atributos considerados naturais, normais e comuns do ser humano - o que Goffman designa por identidade social virtual. O indivíduo estigmatizado é aquele cuja identidade social real inclui um qualquer atributo que frustra as expectativas de normalidade.
Indicadores
de Estigma em Comportamentos Adictivos e Saúde Mental
Indicadores
Individuais – autoconceito e o estigma
Sentimentos de vergonha e culpa por ser dependente de substâncias psico ativas licitas ou ilícitas
e/ou doença mental.
Vergonha e recusa
em receber tratamento, medo de critica alheia
Baixa
autoestima e autoconceito negativo/enviesado ("sou fraco", "não
tenho controlo").
Negação, resistência
ou ambivalência da doença devido a estereótipos e preconceitos (em relação ao
estatuto social), exemplo: "ser dependente é marginal" ou “não é de confiança”
ou “pessoa fraca”
Indicadores
Interpessoais
Tratamento
discriminatório de familiares, colegas de trabalho ou amigos, por exemplo,
exclusão social, rejeição ou isolamento.
Atribuição
moralista ao comportamento adictivo, por exemplo" falta de caráter",
"é escolha, não doença".
Associação
do indivíduo à conduta marginal, conflito, imoralidade ou instabilidade. Por
exemplo, "não é de confiança… nunca será”.
Separação, divórcio
de vínculos afetivos após diagnóstico psiquiátrico, consequências comportamentais
moralmente reprováveis ou internamento para tratamento em regime de
internamento.
Indicadores
Institucionais
Negligência,
desrespeito pelos direitos do doente (falta de ética profissional) ou recusa de
atendimento em serviços de saúde por parte de instituições (política de atendimento
e tratamento) e profissionais.
Atendimento
desumanizado ou com reduzida empatia em serviços de saúde mental.
Falta de
investimento público em políticas de reabilitação e inclusão para individuo
consumidores de substâncias psicoativas. Por exemplo, inexistência de psicólogos,
conselheiros, assistentes sociais (equipas multidisciplinares)
Inexistência
de diagnósticos apropriados e atualizados (Por exemplo, Addiction Society of
Addiction Medicine Patient Placement Criteria )
Prognósticos
(rótulos) que, erradamente atribuem a “culpa” ao utente justificando assim o
insucesso. Por exemplo “Ele ou Ela são uns recaídos. Não querem tratar-se…não
vale a pena.” Critério de exclusão do tratamento.
As dependências
de substâncias psico ativas, os comportamentos adictivos e a doença mental são excluídos
ou não existe prioridade para estratégias de intervenção, prevenção, tratamento
e recuperação na saúde publica. Ausência de vontade, enviesamento e estigma por
parte dos líderes políticos.
Indicadores
Estruturais e Culturais
Enviesamento
nos meios de comunicação social. Por exemplo, individuo dependente é um
criminoso. É um caso de polícia, estes “tipos” deviam ir parar à cadeia”.
Legislação
retrograda e punitiva em vez de políticas de saúde. Por exemplo, “guerra às
drogas e aos consumidores.”
Níveis
elevados de absentismo e conflitos no meio laboral. Perturbações mentais e indivíduos
adictos permanecem no desemprego de longa duração.
Reduzida aderência
aos planos de reinserção social antes e depois de tratamento.
Um dos fatores
de redução do estigma na sociedade acontece quando figuras publicas
importantes/influenciadores decidem recorrer aos meios de comunicação social e
expõem a doença mental ou adicção (substâncias ou comportamentos) ao publico.
São excelentes embaixadores/defensores do tratamento e recuperação. Alguns casos
de atores, atrizes, artistas, desportistas estrangeiros mundialmente conhecidos
defensores do tratamento e recuperação contra o estigma, a vergonha e a negação;
Tiger Woods, Bill Clinton, Anthony Hopkins, Robert Downey Jr, Samuel L.
Jackson, Jamie Lee Curtis, Bradley Cooper, Helton John, Erick Clapton, Demi
Lovato, Drew Barrymore, Keith Urban, Daniel Radcliffe, Russel Brand, Brad Pitt,
Eminem e alguns portugueses que você deve conhecer. Contra o estigma é mais
seguro se seguirmos a dica de Platão, «Estamos duas vezes armados se lutarmos
com fé».
National Institute on Drug Abuse - https://nida.nih.gov/
American
Society of Addiction Medicine - https://www.asam.org/
National
Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism - https://www.niaaa.nih.gov/
Narcóticos Anónimos Portugal - https://na-pt.org/index.php/pt/
Alcoólicos
Anónimos Portugal - https://www.aaportugal.org/
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