domingo, março 11, 2018

" A Recuperação é uma dádiva"





“A Recuperação é uma dádiva, que só foi possível acolhê-la quando me rendi, baixando os braços com humildade, pedindo ajuda.”


 Vivi muitos anos a acreditar que controlava o uso de drogas. Uma vida dupla, com muita manipulação, “a brincar com a vida”. Tempos limpa, tempos a usar, tempos a fazer tratamentos, a construir e a destruir. A última recaída, levou-me rapidamente a um estado de degradação, um completo descontrolo facilitado com dinheiro que meu pai deixou quando faleceu.

Completamente obcecada pelas drogas e a usar compulsivamente à procura de algo que não sabia o que era. Comecei a ter medo de morrer, mas também tinha medo de deixar as drogas e viver sem elas.  Desconectada de mim.  Onde é que eu estava? E foi essa necessidade de me encontrar, mais o amor das minhas filhas que deu coragem para parar de usar, mais uma vez…
Pedir ajuda foi a primeira etapa. Por um lado, sentia-me tão frágil e por outro, queria viver.

Rendi-me perante os factos evidentes da minha destruição total como ser humano. A mais visível era a componente física, mas a mais dolorosa, era destruição da minha alma, invisível a olho nu, mas visível ao meu olhar- uma mágoa enorme, vergonha, desespero, frustração e muita confusão.
Foi quando conheci o programa dos 12 passos que comecei uma viagem diferente. Encontrei pessoas como eu, que tinham problemas com drogas e que queriam aprender a viver sem ter que as usar. As identificações sucederam-se, o sentimento de pertença e amor contribuíram para que começasse a acreditar, que afinal o meu caso, não era um caso perdido, como tantas vezes ouvi.
Após muitas lágrimas e desabafos, deixei-me guiar, deixei de querer controlar tudo em mim. Abri a mente e o coração e só aí começou a aceitação. Aceitei, sou uma adicta, impotente perante a minha doença e contribuiu para perder o domínio da minha vida. Com a experiência que tinha do passado, sabia que estar apenas abstinente não era suficiente, era preciso algo mais. Saber que tinha uma doença e a aceitação deram-me um certo alívio – podia fazer algo – converter a adicta activa e destrutiva na adicta em recuperação e construtiva. Estava determinada a fazer diferente, precisava de mudar atitudes e comportamentos. Não mudar os estímulos externos, que ilusoriamente tantas vezes tinha feito, mas mudar os estímulos internos. Descobri em mim, muitas coisas através daqueles que partilhavam comigo, foram muitas vezes o meu espelho. Descobri que era arrogante, teimosa, orgulhosa, insegura, o que para mim foi um choque, mas que permitiu ter consciência. Nunca tinha olhado para mim e a partilha é mágica. Nasceu, muitas vezes, luz no meu coração e alívio. Eu não estava sozinha. Foi o início de um percurso, que até hoje, eu acarinho e afago, com gratidão!