terça-feira, janeiro 30, 2024

A avaliação na prevenção da recaída (fatores de risco e fatores de proteção)




Capacidades e competências cognitivas e emocionais em recuperação.

Como podemos executar melhores, e mais eficientes, planos de prevenção de recaída dos comportamentos adictivos personalizados (cada caso é um caso), sabendo de antemão que estamos, como seres humanos, expostos à perda da capacidade de avaliação? Da perda do juízo, do discernimento, do bom senso e capacidade critica.

Nascemos e vivemos com esta característica enviesada, portanto em recuperação dos comportamentos adictivos este enviesamento está presente no caminho. Qual é a atitude que desenvolvemos no caminho de recuperação que construímos, gostamos, protegemos, queremos ver reconhecido e melhore a autoeficácia (olhar para nós mesmos como vencedores perante a adicção)? Acontece com um número significativo de indivíduos, há medida que avançam no caminho, pretendem que a recuperação seja duradoura, mas mais importante, revele a melhor versão deles próprios (presente). A recuperação dá trabalho, senão vejamos. Diante a mudança de atitudes e comportamentos (por exemplo, reestruturação cognitiva e literacia emocional) já não se utiliza o termo “Porquê”. Utiliza-se o termo “Como.” O individuo é o agente da mudança.

Vou tentar resumir o conceito de recuperação da adicção. Cada individuo, deverá ter o seu próprio conceito de recuperação. Não é um único evento, é um caminho abrangente e personalizado, abarca a abstinência de drogas lícitas e/ou ilícitas, incluindo o álcool, a sobriedade, crenças/convicções, relações especiais com pessoas significativas, planear e coordenar, identificar traumas e/ou comorbilidades e procurar ajuda, reestruturação cognitiva e literacia emocional (honestidade, compromisso, regular as emoções, assertividade, espiritualidade, promover um estilo de vida que contempla a saúde física e mental, a carreira profissional, hobbies, auto cuidado, fatores de risco e fatores de proteção da deslize/recaída, relações saudáveis e um caminho/rumo com sentido e propósito.

 O que significa avaliação? Quando procuramos a melhor resposta/abordagem é importante recorrermos à avaliação/discernimento/capacidade critica. Diante problemas, desafios e conflitos almejamos possuir capacidades e competências eficientes e resilientes que promovam a autoeficácia.

Porque é que o discernimento/bom senso/capacidade critica é tão importante nas decisões, planos, objetivos?


Quando marcamos uma consulta o que é que esperamos que seja o papel do médico?  Trate da doença e restaure a saúde.

Quando marcamos uma viagem, de avião o que esperamos sobre a função dos pilotos?

Os pilotos executem corretamente as suas funções e consigam pilotar o avião até ao seu destino.

Quando vamos a uma entrevista de emprego importante o que esperamos que sejam as funções do entrevistador?

Queremos que o entrevistador efetue uma avaliação positiva e nos ofereça um trabalho na empresa. Mesmo assim, os peritos mais ponderados, mais experientes e bem treinados são suscetíveis ao preconceito (conjunto de crenças que conduzem o ser humano na direção errada) e ao ruído (variáveis que interferem nas avaliações e que de uma forma aleatória provocam o falhanço no alvo).

O que é o ruído? Imaginemos que o entrevistador está mal-humorado e ansioso, antes da entrevista soube de um problema grave na sua saúde e esta notícia inesperada irá afetar a sua avaliação. De acordo com dados da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), nos últimos dez anos, 70% dos acidentes aéreos são causa humana. Perto de 1,25 milhões de seres humanos morrem nas estradas. Mais de 90% destes acidentes são de causa humana (Organização Mundial de Saude, global status report on road safety, 2015).

O primeiro passo para uma avaliação, mais exata e concreta consiste em compreender as maneiras pelas quais a mente humana se precipita a tirar conclusões. A mente humana, nunca será perfeita, em fazer avaliações, recorrer à auto critica e ao discernimento, mas conseguimos estar alerta sobre as limitações e fazer as correções o melhor possível.

Recuperação e deslize/prevenção da recaída

Avaliação, juízo, sentença, opinião, discernimento, bom senso, capacidade critica.

Num dia tão singular em que iniciamos o caminho da recuperação dos comportamentos adictivos, o que é que pretendemos que aconteça?

Num dia tão singular em que iniciamos a recuperação dos comportamentos adictivos, o que é que a nossa família, os amigos, os colegas de trabalho/o chefe pretendem que aconteça?

A maioria dos indivíduos pretendem que não hajam deslizes/recaídas e que recuperação da adicção seja um processo duradouro, próspero e resiliente. Tal como já foi referido a mente humana, mesmo a mais brilhante, toma decisões preconceituosas, enviesadas e está exposta ao ruído. Com a adicção, a recuperação e a prevenção do deslize/recaída o fenómeno são idênticos.

Quais são as competências, os recursos e mecanismos, o/a adicto/a pode adotar a fim de conseguir manter-se em recuperação desde o início da jornada, apesar do ruído, do preconceito, dos juízos de valor, dos julgamentos pré-concebidos?

Um número considerável de indivíduos toma decisões impulsivas, precipitam-se em tirar conclusões precipitadas erradas, avaliam as suas atitudes e comportamentos de formas enviesadas que despoletam um conjunto critico de decisões que os conduzem ao deslize/recaída. Também sabemos que o deslize/recaída não é o resultado de um evento, é um caminho que se faz caminhando, no caminho errado.  A exposição ao preconceito e ao ruído são inevitáveis, se o individuo não interrompe este processo (o caminho) de deslize/recaída através de uma avaliação, de um discernimento honesto e realista, do bom senso, através de uma capacidade auto critica construtiva.

Após o deslize/recaída quantas tentativas são necessárias que permitam desenvolver uma boa avaliação, gestão de emoções, adquirir discernimento honesto e realista, capacidade critica (estratégias de coping) e bom senso quanto aos factores de risco de recaída?

Terence Gorsky, Marlatt e Gordon, Prochaska e Diclemente foram alguns profissionais que investigaram a prevenção da recaída e a mudança de comportamento. Cada um defendeu o seu dogma, contudo nenhuma das abordagens são consideradas 100% eficazes. Funcionam para uns, mas revelam-se ineficazes para outros.

Pode existir algumas dúvidas sobre a diferença entre deslize e recaída. Deslize é, faço uma analogia com o atletismo, na corrida de pista de 10.000 metros. Todos os participantes estão alinhados à partida. O juiz dá a partida, e o pelotão inicia a sua prova. Chegam aos 3.000 metros, depois aos 5.000 e nesta altura o pelotão está mais alongado. De repente, um participante tropeça noutro participante, desequilibra-se e cai na pista com imenso aparato. O bruar do publico presente é intenso e ensurdecedor. O atleta estatelado na pista está em choque, tem duas hipóteses: 1) rapidamente, levanta-se e acelera a corrida para alcançar os colegas e continuar em prova ou 2) está caído na pista, levanta-se cambaleando e desiste da corrida dirigindo-se aos balneários. Descrevo o deslize no caso número um. Nota: existiram casos de participantes caídos na pista que decidiram prosseguir a corrida e no final ocuparam lugar no pódio.

 

Prevenção do deslize/recaída. 

  • Fazer uma avaliação estruturada, disciplinada, coerente e honesta - Plano
  • Conversar, o mais honestamente possível, com pessoas sobre os preconceitos, juízos de valores, gestão de emoções, melhorar discernimento e bom senso.
  • Praticar a capacidade critica, juntar o feedback e assertividade.
  • Evitar tirar conclusões precipitadas. Ser paciente, porque a resposta, apesar de não ser imediata, pode estar ao virar a esquina.
  • Planear e gerir. Perguntar a mim próprio se estou prestes a tomar a melhor decisão. Refletir se o meu/a minha melhor amigo/a, pessoa em quem confio, pensa sobre o problema/conflito. Perguntar a várias pessoas o que elas pensam sobre o assunto.
  • Conseguir separar a esperança do medo, fundamentar as questões em factos e crenças que reforçam a avaliação, discernimento, a resiliência, bom senso. Esclarece dúvidas e faz perguntas. Antes de correres riscos, fala com alguém sobre a situação.
  •  

 Quando iniciares a tua recuperação, vais construindo um caminho sabendo das tuas limitações e erros.  É possível recuperar dos comportamentos adictivos se fizeres o trabalho de casa, difícil, repetitivo, honesto, atento e feedback. Lidar com os conflitos, aceitar um não, regular as emoções, juízos de valor, preconceito e ruído.

 Sabendo que estás exposto e vulnerável ao preconceito e ao ruído. Quais são os critérios que norteiam as tuas decisões na prevenção da recaída?

O que é que a tua família, os amigos, os colegas de trabalho esperam de ti sobre a prevenção da recaída?

Referências: Daniel Kahneman e Olivier Sibony.

Sem comentários: