quinta-feira, agosto 16, 2007

Linguagem dos Sentimentos - Um Estilo de Vida na Arte de bem viver

A Linguagem dos Sentimentos (Gestão Intrapessoal e Interpessoal)
Como é do senso comum o qualquer ser humano tem sentimentos. Fazem parte de nós, é algo que não conseguimos ver, tocar, cheirar, ouvir, mas que conseguimos sentir, isso mesmo, tão simples. Por vezes tão divertido e relaxante e/ou confuso e desconfortável (atabalhoado). Resumindo, na linguagem dos sentimentos 2+2 pode ser igual a 7.

Na linguagem dos sentimentos podemos amar alguém, mas também podemos odiar e voltar a amar. Quantas vezes as nossas paixões ultrapassaram a razão ao longo da vida? Por vezes, temos a sensação que não conseguimos controlar aquilo que sentimos, e isso pode ser desconfortável e/ou confuso. Noutros casos, passamos uma imagem (exterior) aos outros, diferente daquilo que sentimos (interior). Também avaliamos, na minha opinião erradamente, a aparência exterior dos outros através do nosso interior, comparando e desvalorizando os nossos talentos, por ex. se conhecemos alguém que tem uma bela casa, um emprego e um ordenado excelente, automaticamente assumimos, que essa pessoa é feliz e tem sucesso na vida. A realidade não bem assim.

Aquilo que gostaria de reforçar é a importância em ser honesto/a e verdadeiro/a com os nossos sentimentos, sonhos, paixões e desejos, sejam divertidos ou desconfortáveis. É importante valorizar o nosso interior emocional, como algo do qual aprendemos a aceitar, a conhecer e a respeitar. Não é novidade, que monitorizar os sentimentos dá trabalho, mais, os resultados não são imediatos e/ou gratificantes, todavia, aprendemos a sentir e a não fugir de nós. Negando, minimizando, mentindo quanto aquilo que somos sendo meio caminho para a desonestidade e da irresponsabilidade.

Segundo a abordagem da psicologia cognitiva, aquilo que pensamos (Atitudes) criam os nossos sentimentos, que por sua vez afectam aquilo que fazemos (comportamentos). Atitudes + Sentimentos = Acções (comportamentos). Nós somos aquilo que fazemos com os nossos pensamentos.




O âmago dos sentimentos reside numa zona do cérebro chamada (Sistema Límbico). O modelo tríunico da estrutura do cérebro foi desenvolvido por Paul McLean. Este modelo, que se baseia em três partes: 

1. cérebro reptiliano ou arcaico (instinto);

2. cérebro mamífero ou sistema límbico (emoção) e o

3. cérebro humano ou neocórtex (razão),
cada uma delas desenvolvida em alturas diferentes, ao longo da evolução do Homem, em varias centenas de milhões de anos. Também sabemos que ambos os hemisférios do cérebro apresentam formas diferentes de pensamento – o hemisfério da esquerda é o intelectual, racional, analítico, objectivo, enquanto o hemisfério da direita é intuitivo, imaginativo metafórico, holístico[1], segundo estudos efectuados ao longo de 25 anos por Sperry e Ornstein.

Aprendemos a linguagem dos sentimentos ao longo da vida. Desde a nossa família, escola, pelo grupo de amigos até às pessoas mais significativas. A vida é o processo pela qual passamos, inevitavelmente, sendo o palco das nossas representações e da qual vamos adquirindo a experiência emocional e desenvolvendo uma musculatura suficiente capaz de nos manter em forma para o desafio seguinte, ou não. Por ex. quando experimentamos as vitorias e sucessos, as derrotas e as desilusões, as perdas e a dor. Por outro lado, também aprendemos, como mecanismo de defesa, (justificação, racionalização, maximização, minimização, projecção, etc.), a ignorar, a iludir e a ”fugir” das emoções negativas e desconfortáveis, tais como o medo, a dor, a perda, a vergonha, a mágoa e o remorso, a culpa. Esta constatação, não é uma critica sequer, são factos que correspondem à realidade. Como é do senso comum, nascemos com os sentimentos, mas não nascemos ensinados a sentir (regularização das emoções), aprendemos a observar e fazer, imitando, aquilo que observamos à nossa volta desde o nascimento e ao longo da vida. Na maioria dos casos, aprende-se mais com aquilo que se vê fazer do que se ouve dizer. Somos influenciados pelas pessoas, lugares e coisas à nossa volta.

Por vezes, a nossa cultura reforça este mecanismo de defesa e de ilusão na gestão dos sentimentos, quando por ex. nos homens desde cedo ouvimos, à nossa volta (família e na escola) algumas mensagens do tipo “ Homem não tem medo...”; “Homem não chora... senão é maricas”; “Homem tem que ser forte...”, etc.
No caso da mulher aprende “As meninas tem de cuidar dos outros...." ignorando, por vezes, as suas necessidades; “Mulher tem de ser dona de casa”; “As meninas portam-se bem, não sentem raiva..." ou não se sentem impotentes perante os outros, " As meninas têm que se controlar e serem compreensivas...” sabemos também que na nossa sociedade se tolera melhor um homem bêbado, até revela um certo grau de machismo, caricato e algo “normal”, do que uma mulher.

O que é que os sentimentos têm a ver com a Recuperação das Adicções?
Na minha opinião, através da recuperação aprende-se a sentir e a fazer “ligação directa” aos sentimentos, no aqui-e-agora, sejam desconfortáveis ou de bem-estar. Não é possível usufruir da recuperação, sem permitir que os sentimentos sigam o seu fluxo normal, aquela parte de nós, tão preciosa e especial que foi negligenciada ao longo da adicção activa.  Os sentimentos é algo que não podemos continuar, por mais tempo, a negligenciar através das drogas ou de comportamentos adictivos, pois o processo activo da Adicção evita-se, a todo o custo, sentir, agir nos impulsos ignorando as  eventuais situações de risco e por vezes de perigo. Desenvolve-se, através da lógica adictiva, uma sensação de dormência emocional com substancias ou com outro tipo de adicções. Sabemos que alguns sentimentos, ou a incapacidade de identificar, estão fortemente relacionados com a adicção, evitando assim o confronto com a realidade. O adicto aprendeu a reprimir os sentimentos, a pensar em formas de controlar e a agir no prazer imediato (acting-out) ex. usar mais drogas e/ou álcool, mais comida, mais pornografia e/ou prostituição,mais uma ida ao casino. Este tipo de lógica adictiva reforça que o que importa é o agora/momento (prazer/”pedra”), evita-se planos a médio ou longo prazo, opta-se pelas promessas, porque a probabilidade os planos falharem é enorme. Evitam-se os compromissos responsáveis e as relações honestas.

Também sabemos que as substancias psicoactivas lícitas, incluindo o álcool e as ilícitas e /ou os comportamentos adictivos provocam a ilusão e a negação da realidade. O adicto vive num “mundo à parte”, de máscaras, onde aquilo que se sente não é revelado, mas escondido, “vida dupla”. É essencial ir removendo estes mecanismos de forma a assimilar e fazer a adaptação à realidade.Por isso, para se ser honesto e responsável pela recuperação individual, o adicto aprende a responsabilizar-se pelos seus sentimentos, comportamentos problemáticos e disfuncionais (adictivos) bem como estabelecer relacionamentos saudáveis com as outras pessoas baseados em princípios espirituais, não religioso sem dogmas e divindades, e através de valores morais e éticos, praticando o principio, por ex. “Não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem a ti...

Em recuperação o adicto aprende a distinguir os sentimentos, dos defeitos de carácter e dos comportamentos. Por ex. pode sentir medo, logo não significa que seja um fracassado, um incapacitado. È Ok sentir, é normal e humano. Não significa que vamos perder o controlo das nossas emoções, pelo contrario, é através do sentir que exploramos as nossas competências e e recursos. Aprende-se a enfrentar a dor e a perda, das drogas, do álcool, do jogo, do comida, das relações disfuncionais, do sexo, das compras, do furto e as sensações que estas experiências proporcionavam, com o apoio dos outros. Se está em recuperação pense, “Não estou sozinho nestas emoções dolorosas. É normal sentir e identifico-me com pessoas à minha volta.”.


Como posso identificar os meus sentimentos?
Não existem “receitas magicas” ou “milagres”. É necessário fazer um trabalho pessoal emocional (virado para dentro de si), de inter-ajuda e compromisso diário. É extremamente difícil enfrentar este desafio, com sucesso, caso o faça sozinho. Encontre pessoas disponiveis.

Dica:

1- Procure identificar o sentimento enquanto ele está a acontecer, no aqui-e-agora. Pergunte a si mesmo: Como é que me sinto agora? Estou triste? zangado? contente? confuso? feliz? ansioso?

2- Admita o sentimento.. Desenvolva a introspecção, discernimento e o auto-conhecimento. Lembre-se, é OK sentir. Nos sentimentos não existe certo ou errado ou qualquer tipo de moralismo. Evite julgar ou criticar o sentimento. "Qual o sentido deste sentimento? Porque é que estou a sentir ........... (sentimento)?"

3- Identifique a “fonte” a “raiz” do sentimento. Desenvolva a autoconsciência e a responsabilização. "O que é que está a provocar este sentimento?"

4- Partilhe com alguém de confiança e disponível os seus pensamentos e sentimentos. Alguém que tenha a capacidade em ouvir activamente. Evite julgar ou criticar os sentimentos.

5- Aprenda a gerir as emoções de uma maneira construtiva. Mobilize as suas emoções ao “serviço” de uma causa humana e espiritual imaterial e individual, não religioso sem dogmas e divindades (nós e Ele/Ela ou Algo que o transcende, que o surpreende, o inspira, que o motive, que o liberte, que o orienta nos momentos complexos do devir e o aceite como é).

6- Reconheça e valorize os sentimentos dos outros. Desenvolva a empatia, espontaneidade, honestidade, a reciprocidade e a autenticidade.
7- “Mais será revelado...e mais além”

[1] "Provém de holos em grego que significa totalidade. É a compreensão da realidade que articula o todo nas partes e as partes no todo, pois vê tudo como um processo dinâmico, diverso e uno".

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