sábado, janeiro 20, 2018

Sinais dos tempos - a adicção aos videojogos


Desde os tempos mais remotos, o ser humano precisou de se alienar, de negar a realidade e adapta-la à sua vontade, de entrar em contacto com algo que o transcenda, precisou de “amortecedores” e “filtros” para se relacionar consigo próprio e os outros. Há vinte anos atrás, em Portugal, as adicções mais conhecidas eram as dependências de drogas ilícitas, vulgo toxicodependência (termo em desuso), o alcoolismo e numa escala mais reduzida o Jogo patológico a dinheiro nos casinos. Na ultima década, as “velhas” adicções mantêm-se inalteráveis, com algumas mudanças (novas substancias psicoactivas ilícitas foram descobertas) e surgem as novas doenças do comportamento adictivo relacionados com a Internet (redes sociais, os videojogos e o jogo patológico online a dinheiro). Mais recentemente, surgiram noticias nos meios de comunicação social de que a Organização Mundial de Saúde decidiu que a adicção aos videojogos (comportamentos adictivos) será incluída na revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, previsto para 2018 cuja sigla é conhecida como CID. Significa que, brevemente, todos nós iremos ter acesso aos critérios de diagnostico da doença e a respetiva legislação. Costumo dizer que jogar está no nosso ADN: quem é que não gosta de jogar? Quem é que joga para perder? Talvez por isso os vídeos jogos sejam uma indústria milionária que gera milhões de euros em todo o mundo.

Enquanto aguardamos pela revisão do CID, podemos avançar com um dado importante sobre a adicção aos videojogos, indicador comum identificado também em todas as adicções, seja às substâncias psicoactivas do sistema nervoso central, vulgo drogas, incluindo o álcool ou os comportamentos (jogo patológico a dinheiro, sexo, compras, shoplifting/furto, perturbação do comportamento alimentar, dependência emocional). Este indicador encontra-se nas estruturas cerebrais envolvidas no prazer e recompensa (neurotransmissores) que comprometem seriamente a motivação, a memoria, a atenção/controlo. Simplificando, para que toda a gente perceba, umas pessoas mais do que outras, todos perdem o controlo do seu comportamento adictivo. A partir do momento em que a adicção é despoletada, o individuo revela-se incapaz de prever com exatidão as consequências do seu comportamento problema; consequências na saúde (física, mental e espiritual), na família, na escola/trabalho, justiça, questões económicas/financeiras.


Na adicção aos videojogos também identificamos a perda do controlo. O individuo jogador, gradualmente, vai obtendo cada vez mais prazer e recompensa em detrimento da capacidade de auto critica, adiar a gratificação e o controlo sobre a sua atividade, pode estar a jogar durante horas e horas:
  • Não se alimenta devidamente,
  • Problemas de sono,
  • Redução significativa no aproveitamento escolar ou faltar às aulas (absentismo escolar),
  • Irritabilidade e comportamentos impulsivos,
  • Isolamento social, incluindo com a própria família,
  • Pessoalmente, conheço um caso de um jovem que jogava vídeo jogos, durante 12 horas consecutivas. 

Entre profissionais e o publico em geral, acabaram-se os tabus e os mitos sobre a problemática associada aos videojogos. É oficial, existem alguns adolescentes e jovens adultos, felizmente não são todos, vulneráveis à adicção aos videojogos que precisam de tratamento. Esta mudança de paradigma irá permitir o diagnóstico da doença, assim como estratégias de intervenção, prevenção, assim como, definir o modelo de tratamento e da recuperação.  


O que é que o futuro nos reserva, no que diz respeito às pessoas e aos comportamentos adictivos? Gadgets? Robôs? Inteligência Artificial? No futuro, o ser humano e a sua curiosidade irão impor-se, tal como sempre aconteceu, está na nossa natureza e revela-se extremamente apelativo, a busca do prazer intenso e da recompensa, suficientemente intensa e capaz de alienar, negar, transcender e conduzir para uma realidade dolorosa, a medio e longo prazo, com consequências negativas. O tempo nos dirá. 

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