Sempre me despertou imenso interesse o trabalho da prevenção da recaída e as fases de recuperação no vasto e complexo universo de tratamento e de recuperação da adicção.
Na minha experiência de trabalhar em tratamento não me recordo de alguém que tenha terminado o tratamento, afirmasse “João, vou para casa e vou voltar a usar drogas e continuar dependente”. Pelo contrario. No caso das pessoas que recaíram, após o tratamento, a grande maioria afirmava que tinha sofrido experiências demasiado horríveis, relacionadas com dependência das substâncias psicoactivas lícitas, inlcuindo o alcool e as ilícitas. Acredito também que após um tratamento de internamento as coisas nunca mais serão vividas da mesma forma, quer para aqueles que permanecem abstinentes quer para aqueles que têm deslizes e recaídas. Adquiriram um conhecimento e uma consciência da realidade e da doença, como uma mais-valia. É como plantar uma "semente", o resto deixa de estar ao nosso alcance. È preciso saber aguardar pelos resultados...
Existem vários factores associados a uma transição com sucesso após o tratamento, em regime de internamento para o regresso à vida activa. Após um período de tempo em tratamento em regime “fechado” é chegado o grande momento; ambicionado e temido ao mesmo tempo – de regresso à vida activa. Para a maioria dos adictos abstinentes, familiares, amigos, e em alguns casos no local de trabalho, é um período onde se experimenta um misto de emoções tais como; ansiedade e alegria, insegurança e confiança e re-adaptação.
Adictos abstinentes que possuam fracos recursos e/ou que não se sintam confiantes podem estar mais vulneraveis quanto cometerem deslizes, ao contrario daqueles que sintam mais confiantes. Individuos que desconheçam e/ou não confiem nos recursos de protecção disponíveis(pessoas, lugares e coisas -P.L.C.) para os apoiar, durante a abstinência, tal como, aqueles individuos que tenham duvidas acerca da viabilidade e da eficácia desses mesmos recursos protectores é possível, perante a adversidade, não utilizarem as “ferramentas” de recuperação para si mesmos.
A Teoria da Aprendizagem Social e da Eficácia Pessoal
No dia-a-dia, após o tratamento, quando as pessoas se deparam com uma situação de alto-risco de deslize (pessoas, lugares e coisas - PLC) têm a tendência para efectuar julgamentos/juízos acerca de qual será o resultado e/ou consequência dessas mesmas situações, tal como, avaliar as suas próprias capacidades para lidar com essas adversidades. Por ex. encontrar uma “velho” amigo/a que use drogas ou depois de ter tido uma grande discussão com a namorada/o dar por si mesmo a pensar em usar drogas. Faz parte da vida e da recuperação estas adversidades e contrariedades (situações de alto-risco). Se o julgamento/intuição de eficácia pessoal é reduzido será provável que antecipem um deslize; voltando a usar drogas e/ou beber alcool. Sentir que a sua eficácia pessoal é segura e eficiente, os individuos são mais persistentes desenvolvendo uma variedade de estratégias de forma a evitar/adiar o uso de drogas e/ou beber alcool. Ao mesmo tempo, que surgem situações de alto-risco, a nível cognitivo, existem sinais de alerta (mecanismo) que possibilitam a avaliação do risco.
Para alguns adictos, esses mesmos sinais de risco são minimizados e ou negligenciados (auto-ilusão, racionalização, justificação, minimização, negação). Por ex. num restaurante, um grupo de amigos está almoçar. Passado um par de horas, alguns já estão mais eufóricos, devido à ingestão de bebidas alcoolicas, que outros. Um membro do grupo dos “eufóricos” exclama para um do grupo não “eufórico” - “Olha lá ó Xavier, só bebes duas cervejas?! Nós já bebemos 8 cervejas... Bebe mais uma...” O outro responde – “Não bebo mais. Já chega por hoje. Estou bem assim.” O “eufórico” insiste – “Vá lá..., só mais uma, qual é o mal? Estamos a divertir.” O outro responde – “Não, estou bem assim. Não quero mais.” Se o membro do grupo dos “eufóricos” tiver um historial de problemas com o álcool, pode continuar a beber, ignorando os sinais de alerta (situação de alto-risco), por ex. conduzir a sua viatura, enquanto o outro, que optou por não beber mais, permanece alerta aos sinais perigo e decide não correr riscos desnecessários. Esta situação pode acontecer com um adicto que esteja abstinente ignorando, assim os sinais de alerta quanto a situações de alto-risco (pessoas, lugares e coisas - PLC). Se convidado para beber bebidas de teor alcoolico, o adicto abstinente imediatamente avalia a situação e decide tomar uma posição; recusa o convite ou decide aceitar.
È importante identificar quais as situações de alto risco de deslize/recaída, desenvolver e praticar estratégias e recursos protectores, receberfeedback construtivo dos seus pares e compreender como a sua eficácia pessoal deverá ser aperfeiçoada, através da persistência, da honestidade, do compromisso e da determinação, colocando-a em pratica, numa base diária, de forma a prevenir a recaída.
Medidas preventivas/protectoras da abstinência, em situações de risco de deslize/recaída.
* Estar atento aos sinais/riscos potenciais de recaída, situações (pessoas, lugares e coisas - PLC) que despolete o “gatilho” (triggers the craving) - vontade intensa (fixação) em usar álcool e/ou outras drogas. Identificar as características pessoais mais vulneráveis, (por ex. relações amorosas, situações de pressão e stress, alterações de humor (depressão, ansiedade) no inicio da abstinência),
* Confiança nos recursos e nas respostas que se estão disponíveis na prevenção do deslize/recaída (pessoas, lugares e coisas - PLC),
* Confiança nas competências pessoais de forma a utilizar esses mesmos recursos e respostas de uma forma positiva e eficaz,
* Oportunidade de testar e praticar as respostas e receber feedback (de individuos que estão em sobriedade/recuperação) de forma a melhorar as capacidades pessoais nas gestão da abstinência. Não vale a pena correr riscos desnecessarios, por ex. "pôr se à prova".
Uma Transição de Tratamento em Regime de Internamento para o Regresso á Vida Activa com sucesso deve promover uma informação especifica acerca dos riscos de recaída num tipo de linguagem que a pessoa/adicto possa entender.
Outra opção é desenvolver as competências-da-solução-do-problema (problem-solving skills) que minimize as hipóteses de beber /usar drogas em situações de alto-risco.
“SODAS” um modelo de cinco-passos que permite tomar decisões construtivas:
1. Stop - Qual é a situação de alto-risco? Identificar o problema e a solução;
2. Opções - Qual é a acção alternativa que pode pensar? Identificar as consequências positivas e negativas associadas a cada alternativa;
3. Decidir - Depois de avaliar as alternativas, seleccionar uma;
4. Acção - Agir na decisão tomada,
5. Auto-elogio - Elogiar-se a si mesmo através mensagens internas [dialogo - -auto afirmações por ex. Eu sou...] por reconhecer os resultados positivos
Diga para si “Só por hoje não preciso de usar álcool/drogas para o resto da minha vida”
Referencias: Northwest Frontier Addiction Technology Transfer Center
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