quinta-feira, junho 03, 2010

Historias de Vida na Recuperação da Dependência (Rostos e Vozes)

Ao longo de 17 anos de carreira profissional "acumulo" um vasto registo de historias de pessoas. Historias de vida. Historias reais repletas de drama e coragem, de sofrimento e de humildade, de doença e Recuperação. Recordo o nome do primeiro paciente. Recordo imensos rostos e vozes. Alguns são exemplo "vivo" daquilo que o ser humano é capaz de (re)inventar de forma a Recuperar.

Recordo uma dessas historias reais.

Conheci um individuo dependente com 38 anos, em tratamento em regime residencial de internamento, afectado pela progressão (consequências negativas) da doença activa (dependência) ao longo de 20 anos. Inúmeros problemas na saúde, família e emprego.

Após o período inicial de adaptação ao tratamento,  aproximadamente de um mês, certo dia queixava-se de dores de cabeça e pediu medicação. Como era costume, encorajávamos os nossos residentes a ventilar e a expressar as suas emoções dolorosas. Sabíamos que as dores de cabeça eram "normais" derivado à abstinência e à "pressão" do tratamento ex. viver 24/24 horas com 20 e tal indivíduos na mesma casa, grupos diários de terapia, trabalhos escritos (ex. os 45 exemplos danos e impotências), regras da casa, enfim uma realidade completamente distinta do "mundo" da dependência. A maioria dos dependentes fica extremamente ansioso, quando está com algum sintoma desconfortável (dores); a reacção imediata é "Quero medicação... dói-me imenso a cabeçaNão aguento isto."

Este individuo andou mais ou menos cinco dias a queixar-se de dores de cabeça. Com a agravante dos sintomas agudizarem-se conforme os dias iam passando. A medicação obedecia a um determinado protocolo clinico por ex. uma vez por dia, ou de 8 em 8 horas, dependendo de cada caso.
Comecei a constatar que algo se estava a passar de anormal. Encaminhei este individuo para a urgência do Hospital, recordo que foi acompanhado por um paciente mais "antigo," que também recordo o nome e o rosto.